domingo, 13 de setembro de 2015

Chega uma hora que a hora chega.

  Talvez você não saiba que depois daquela nossa conversa na calçada eu esperei que a luz do celular acendesse e seu nome aparecesse na tela com uma mensagem de "Boa noite, quero falar contigo". Talvez você não saiba que eu percebi que você não quis entrar por medo de não ter coragem de olhar pra tudo que lembra nós e a aflição te criar um nó na garganta a ponto de travar a fala. Mas você sabe que eu vi quando você desviava o rosto e evitava me olhar nos olhos, com medo de se sentir culpado por poder estar deixando o amor da sua vida de maneira tão sútil.
    Eu sei que chega uma hora que a gente tem que falar, de um modo ou de outro, que o outro não é mais do nosso modo. Sei também que a gente idealiza um sentimento e vê que cara a cara a realidade não bate. As vezes bate, bate tanto que até esvazia o coração antes mesmo do fim chegar. Eu sei que o fim chega. Você sabia que ia chegar. Mas não sabia que eu me preparei pra ele, que esperei pela hora de ouvir uma centena de frases explicativas e que possivelmente cumprisse o papel de maquiar a situação. O que nem eu e nem você sabemos é até quando esse misto de sentimentos abstratos vai ficar por aqui.


   Enquanto isso, a ausência bate na porta e traz de acompanhante uma dose de saudade. Olhando pela fresta eu imagino que elas trouxeram um pouco de indecisão para bebermos. Mas sei que você não virá de novo, porque sabe que nem sempre um não quer dizer exatamente não. Dentre as milhares de coisas que sabemos, ficam outras milhares suspensas no ar e o tempo de duração dessas certezas é indefinido. Só que sempre há de chegar uma hora que as coisas chegam. Até lá, nesses encontros casuais, a gente se olha de longe, mas desvia de novo o olhar, pra ninguém perceber que nem tudo é o que parece ser.

terça-feira, 28 de outubro de 2014

perder sem encontrar

    Meio sonolento ouvi passos e vi a luz entrar e sair por uma fresta da porta, que havia sido aberta e fechada rapidamente de maneira silenciosa.  Ainda zonzo e abatido pelo efeito do álcool, rolei na cama cravando uma batalha contra o meu eu. Aquela situação não era aceitável. Lembrei-me de sua risada ecoando por toda a rua, enquanto voltávamos andando pela calçada. A chuva caia levemente e logo que saímos do barzinho vi seus olhos castanho-avelã brilharem como nunca. Dispensamos táxi, caronas e qualquer outra coisa que pudesse impedir a chuva de lavar nossa almas.
    Ela me disse com aquele tom de voz firme, sem rodeis, como quem sabe o que quer, como quem tem todos os sonhos do mundo em um só pensamento: - Você não pode se deixar levar por suas convicções inabaláveis. Descontração faz parte do jogo e, meu bem, ganhador mesmo é aquele que não se entrega, controlando o incontrolável. Com isso, tentei bater boca de maneira que pudesse argumentar e enumerar os benefícios de se ter alguém, de ser de alguém. Mas ela me venceu, dizendo que ser todo mundo é bem mais completo e exige menos do coração.
    Cada esquina refletia uma faceta daquela mulher admiravelmente inteira. A sinestesia fazia com que meus instintos se aflorassem e a vontade de guardá-la em um lugar secreto se misturava com a vontade de mostrá-la ao mundo. Perdê-la sem decifrá-la me dilacerava aos poucos. Foi então que subimos ao terceiro andar, tomamos vinho e viajamos do Brasil ao Japão. Entre um sonho e uma mordiscada de realidade, ela se entregou da forma mais bonita. Eu a quis mais perto.
   Mas quando me dei conta havia somente o seu cheiro em meu casaco molhado que estava jogado em uma cadeira da cozinha. Eu que planejei mil e uma maneiras de convencê-la a ficar hoje, amanhã e quem sabe depois, fui arrebatado pelo sono que a levou de mim, deixando apenas um batom vermelho-sangue caído no chão do quarto. Era uma prova física de que tudo tinha sido real.

terça-feira, 24 de junho de 2014

- Então, quer casar comigo?- Claro! Claro que sim. 

        Noite a fora, um anel, muitos sorrisos, abraços, carinhos, planos e declarações de amor. Viagens, lugares, cores, pessoas, um misto de alegria e ansiedade. Música calma e tudo parece ser a gravação de um filme. Uma noite não dormida, com 4 pés em uma cama. Hora de ir embora, o dia amanheceu e a vida pede urgência.
        Abrir a porta, olhar no espelho e encarar a realidade. Me lembro de ter visto em algum lugar, nossas vidas passando pela mente como um flash, no momento da morte. Mas eu não estou morrendo. O que há de errado? A resposta não parece estar em lugar nenhum. 
        Não queria dizer que não, mas também não podia ter dito que sim. Essa palavra obriga as pessoas a serem felizes o tempo todo, a criarem uma rotina completamente sufocante e não sei se eu consigo. Na verdade, eu não quero.  Isso me remete a outra confusão, porque eu sempre quis ser feliz o tempo todo, ter uma rotina - não sufocante, mas pelo menos ter uma - dormir e acordar ao lado de alguém. Que alguém? 
        Gostaria de ser mais precisa nas minhas decisões, ter mais certeza das coisas que eu quero, das coisas que eu sei...
        Tenho vontade de ser imensa, mas que eu ainda caiba no mundo. Tenho vontade de beber todos os drinks de todos os bares e permanecer sóbria, dançar todas as músicas sem nunca me cansar, conhecer todas as pessoas, sem esquecer quem sou eu. Conhecer os mesmos lugares pela primeira vez, de novo e de novo.  Fazer viagens que durem um mês ou mais, sozinha ou com amigos. É tudo tão solto.
        Queria um pouco de distância para silenciar minha mente e embora cigarros sejam bonitos apenas em fotos,  um ou outro me ajudaria agora.

Noite clara e céu de estrelas. 02 de abril.

- Filha, está pronta?
O vejo sorrindo através da janela e percebo que não há drinks, pessoas diferentes ou lugares novos, muito menos cigarros. Somos somente eu, ele e (...)
 - Claro. Claro que sim.
Untitled


Co-autor: Everton Souza de Moraes

quarta-feira, 21 de novembro de 2012


         Mais uma festa em um dos muitos clubes da cidade, todos sem sentido devido a grande quantidade de bebida que já ingeriram. Eu havia bebido apenas dois copos de uísque, mas quando te vi achei que sua beleza era efeito do álcool em meu cérebro. Você apenas sorria misteriosamente, se deixando balançar ao ritmo da música que tocava.
         Califórnia King Bed fazia com que seus cabelos que chegavam até a cintura, balançassem de uma maneira que me deixava tonto. Pisquei os olhos mais de três vezes pra ter certeza de que você era real e não fruto da minha imaginação perturbada ou quem sabem um truque do desejo.
          Ruiva, de olhos verdes, e roupa que fazia contraste com a sua pele. Tive a impressão de que todas as luzes da festa conspiravam a teu favor, realçando algo em você que ainda não consigo descrever. Um brilho que refletia longe, chegando até os meus olhos. Eu poderia tentar a sorte e me aproximar, pois não havia nada que me dissesse pra não me apaixonar por você naquele instante.
       Você me parecia tão segura de si, que temi que não estivesse sozinha. Afinal, alguém com o teu sorriso não poderia estar melancolicamente triste. Isso! Você se bastava e esse era o teu segredo o tempo todo. Não existia aquela necessidade da presença de uma outra pessoa pra te preencher. A música acabou e vejo você olhar ao redor, como se estivesse à procura de algo. Sua presença me deixou desconcertado a ponto de não conseguir me concentrar para descobrir qual o novo hit que estava tocando.
     Como em um conto de fadas o encanto foi quebrado logo que o garçom a fim de me oferecer mais um drink se posicionou à minha frente, impedindo que eu pudesse perceber que você estava de saída, já que os meus olhos te procuraram por todos os cantos em meio à multidão e não te encontraram. A cadeira mais próxima foi à única solução para o meu desalento por perceber que você se foi.
      Será que se eu não tivesse recusado as outras doses de uísque que me ofereceram, essa história deixaria de ser apenas uma lembrança de um sábado à noite em uma festa qualquer? O anseio me impediu de descobrir se eu seria suficientemente capaz de um dia ser o motivo dos seus sorrisos.


 
Parceria: Everton Moraes

sexta-feira, 16 de novembro de 2012

Pedaços de um amor que não chegou ao fim.

       
       É dois de abril e como em todos os anos que se seguiram depois que te conheci e sem querer te vi partir, sabia que não seria fácil. Acordar e sair novamente à procura de algo que te trouxesse pra mais perto de mim não é uma tarefa agradável, já que todas as buscas são feitas em vão. Berlim te levou pra longe. Sim, eu sei que você almejava uma bolsa de estudos fora e uma oportunidade como essa não poderia ser desperdiçada. Mas e eu? Bem, eu fiquei aqui, toda despedaçada. Cada vez que algo me lembrava você, sentia como se estivessem arrancando partes de mim e jogando ao vento.
      Não foram poucas as vezes em que pedi a Deus pra que você também estivesse pensando em mim ou que pelo menos, ao ouvir a nossa música, ainda sentisse aquele arrepio bom que surgia toda vez que nos abraçávamos. Depois, passei a desejar que alguém - qualquer alguém - estivesse andando por aí e por acaso juntasse os meus pedaços e me remontasse, trazendo de volta tudo que você levou. Qualquer alguém que não estivesse na Alemanha.

segunda-feira, 29 de outubro de 2012




                    "Permite-me o exagero só por hoje, meu amor. Essas palavras que me rolam da caneta sem controle, desesperadas ao teu encontro, saltitam no papel alegres do teu riso. Perdoa a pontuação desencontrada, a gramática defeituosa, as metáforas mal construídas e a verborragia paranoica sem pausa para respiração. É que sou tua, amor. Sou tão e somente tua. Não quero mais pausas entre os beijos e nem abraços frouxos. Quero sentir estar em ti tanto quanto estás em mim. E hoje não ligo se me tomas por louca, apavorada, intensa em demasia ou enfeitada em excesso. Quero-te como uma criança que pede um doce aos pais no balcão da padaria que mal alcança, sinto-te como quem fecha os olhos e acompanha a melodia da música que vem do longe com o corpo inteiro, tenho-te como quem deixa pousar uma borboleta no ombro e encanta-se com a beleza de suas cores e mal se move com medo de que fuja, aproveitando cada segundo desse pouso breve. Meu peito é teu pouso, querido. Não se tarde retornar à tua morada, tua amada que te espera em sorriso só pelo prazer de querer-te com tanto ardor. Peço aos céus que teu retorno seja breve. Sinto-te cada vez mais aqui, perto, tão perto que é dentro, que é um só comigo."
                                
                                                                                                                 - tumblrs

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

A menina era bonita, viu? Fiquei encantado, me lembro bem. Divertida, mas não sei, era auto-crítica demais. Andava firme, mas era insegura. Cheia de vícios e manias, eu achava engraçado. Não um engraçado de rir, um engraçado charmoso. Não parava de mexer no cabelo, ajeitar a roupa, falava baixo, ria alto. De longe dava pra entender o que ela tava falando, cheia de gestos e caras. Tinha muitos amigos, mas era carente. Aquela menina era a contradição em pessoa, nunca me esqueço. Um dia paramos pra conversar e trocamos desabafos. Queria fazer um questionário infinito, mas fiz algumas perguntas-chaves: Por que você anda reta, mas olhando pra baixo? Quem é o motivo desses sorrisos de canto a canto? Por que tanta mania e timidez? Fui interrompido e atropelado por respostas, que pouco esclareciam seu mistério escancarado. "Olho pro chão porque tem coisas que eu prefiro não ver. E são muitas coisas, todos os dias, de todos os lados. Sorrisos falsos, pessoas pequenas, gente que eu perdi se encontrando fora de mim. E me dói, então o que os olhos não veem, você sabe... Sorrio nem sei porque, muito menos por quem. Por mim, por toda essa gente que quer meu bem. Ninguém em especial, ninguém especial. Queria conseguir ficar uma semana triste, de cara fechada e seca com o mundo. Mas eu choro rindo, morro sorrindo e ninguém desconfia, talvez seja melhor. Tenho a impressão contínua de que nunca tá bom o suficiente. Meu cabelo, minha maquiagem, minhas roupas, meu jeito. Eu. Muita gente chega e quase todas vão embora. Antes da hora, na hora, depois. Ás vezes me arrasa, mas não lamento, fica quem tem que ficar, não é? Eu sei isso de cor também. Mas não dá pra evitar a sensação de, sei lá, pensar que o problema não é de quem parte. Talvez eu seja sem medidas demais e canse. Louca demais e enlouqueça. E nessa, quem não consegue descansar sou eu." A menina era mais que bonita, viu? Muito mais. Uma pena ninguém acolher e deixar que ela, enfim, descanse. Em paz.

(Marcella Fernanda)